quarta-feira, 23 de março de 2022

Sem ter petróleo, Argentina tem gasolina bem mais barata

 

Brasileiros passam até quatro horas em filas de postos de combustíveis em Puerto Iguazú, na Argentina, na fronteira com Foz do Iguaçu (PR), para comprar gasolina mais barata. O movimento está causando até falta de combustível para os moradores. Os cinco postos da cidade de 80 mil habitantes não conseguem atender a demanda porque passaram a receber volume menor de gasolina e diesel após a alta do petróleo.

Os brasileiros cruzam a fronteira para encher o tanque mesmo tendo que enfrentar filas e pagar mais que os consumidores argentinos. Em Puerto Iguazú, o combustível é mais caro para estrangeiros. Enquanto os argentinos desembolsam de R$ 5,17 a R$ 5,56 pelo litro da gasolina aditivada, brasileiros e paraguaios pagam cerca de R$ 6,65 a 6,82, conforme o câmbio. Em Foz do Iguaçu, a gasolina aditivada custa em média R$ 7,30 o litro, podendo chegar a R$ 7,49. Pelas regras dos postos de Puerto Iguazú, só é permitido aos estrangeiros abastecer o carro com gasolina aditivada, que é mais cara.

Os motoristas brasileiros ainda precisam seguir outras exigências. Só podem abastecer até 40 litros por tanque e respeitar horários determinados pelos postos. As bombas estão disponíveis para estrangeiros apenas das 12h às 18h e das 23h às 6h, em dias de semana, e das 12h às 6h em finais de semana e feriado. Nos postos, há filas diferenciadas para argentinos e estrangeiros, e alguns estabelecimentos não vendem combustível para brasileiros.

Apesar de todas as dificuldades, para alguns motoristas, cruzar a fronteira ainda compensa. O mototaxista Angelo Pereira vai a Puerto Iguazú a cada dois dias para encher o tanque. Ele e a esposa, que é motorista de aplicativo, dependem do combustível para sobreviver. Por isso, a diferença no preço compensa.

Se formos trabalhar com o combustível brasileiro, não temos lucro”, diz. Pereira conta que percorre 30 quilômetros, ida e volta, entre Foz do Iguaçu e Puerto Iguazú.

Brasileiro que estuda medicina no Paraguai, Hiago Afonso vai a Puerto Iguazú toda semana, mesmo tendo que enfrentar uma espera de duas a quatro horas nas filas. Ele diz que gasta cerca de R$ 400 de sua camionete para encher o tanque no Brasil. Na Argentina, o valor cai para R$ 247. Para aproveitar a viagem, Afonso às vezes também compra carne pela metade do preço cobrado no Brasil.

As filas para abastecer não se restringem aos brasileiros. Com o combustível em falta, os argentinos às vezes precisam aguardar horas até que os postos recebam gasolina. Morador de Puerto Iguazú, o construtor Miguel Valverde conta que às vezes fica quatro horas em filas. Para Valverde, a presença de brasileiros é bem-vinda na cidade porque mexe com o comércio e gera dinheiro.

A alta demanda pela gasolina criou um comércio clandestino em Puerto Iguazú. Motoristas dizem que, quando o combustível acaba ou o horário de abastecer para estrangeiros chega ao fim, vendedores de gasolina circulam próximo às filas para oferecer o produto um pouco mais caro que nos postos.

Um motorista brasileiro revelou que foi abordado e convidado a ir à periferia da cidade, mas acabou desistindo. “Nós não sabemos que gasolina vamos comprar”, diz Nilvaldo da Silveira. Sabendo da prática ilegal, a polícia argentina intensificou a fiscalização em Puerto Iguazú.

Representante da Câmara de Combustíveis da província de Misiones, Faruk Jalaf diz que o desabastecimento atinge outras localidades da Argentina porque não há produção suficiente no país para atender a demanda.

No caso de Puerto Iguazú, situada em Misiones, a situação é pior porque a cota de combustível destinada à cidade é menor em relação a outras localidades do país, e a demanda de brasileiros e paraguaios é grande.

Por isso, o preço na fronteira é em geral mais alto que em outras localidades da Argentina. “Só uns 3% de moradores de Foz do Iguaçu levam toda gasolina”.

Jalaf ainda diz que as petroleiras instaladas no país preferem exportar o produto em vez de vendê-lo no mercado interno porque o preço praticado não cobre os custos de produção. “Os únicos que sofrem as consequências são os postos, porque têm os preços congelados”, afirma.

A gasolina, que no final do ano custava pouco mais de R$ 3,40, teve reajuste após o aumento no valor do barril de petróleo.

O professor do curso de Engenharia de Energia da Universidade Federal da Integração Latino-America (Unila) Ricardo Hartmann explica que o valor da gasolina na Argentina é mais em conta se comparado ao Brasil porque lá o governo faz a mediação de preços, ou seja, aplica uma política e não fica sujeito à variação do mercado internacional.

O Brasil não essa faz mediação desde o governo do ex-presidente Michel Temer. “Com a guerra, nós sofremos porque não há mediação. O governo optou por deixar o preço ao gosto do mercado.”

Uol



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