Michel Temer terá saudades do tempo em que se autoproclamava um “vice decorativo”. O Brasil ia a pique, mas ele, aliviado, podia botar a culpa em alguém. Hoje, autoconvertido no presidente mais impopular da história, Temer enxerga o culpado no espelho. Numa pesquisa com margem de erro de 2 pontos percentuais, Temer obteve a aprovação de 3%. Oito em cada dez brasileiros abominam seu governo. Um candidato apoiado abertamente pela alma penada do Planalto entra na corrida presidencial rejeitado por 92% do eleitorado.
Um presidente assim, reduzido a uma condição análoga à de lixo hospitalar, já não pode nem mesmo cultivar a ilusão de que preside. Até maio de 2017, Temer degustava a expectativa de que o PIB chegaria ao segundo semestre de 2018 bombando, a caminho de um crescimento anual acima dos 3%. Nada mal para um governo que herdara a ruína de Dilma Rousseff (queda de – 7,2% do PIB no biênio 2016-2016). Mas sobreveio o grampo do Jaburu. E tudo virou epílogo no enredo do governo Temer, que passou a ser presidido pelas circunstâncias. Após insultar a ética, o pseudo-presidente começou a comprometer a tênue recuperação econômica. O PIB de 2018 já é projetado abaixo de 2%.
Suprema ironia: a exemplo do que fazia Dilma, Temer e seus operadores já esboçam desculpas escoradas em fatores externos. Os Estados Unidos crescem além do esperado. Para conter a inflação, o banco central americano eleva os juros. Com isso, investidores que buscavam lucro fácil em mercados como o brasileiro passam a preferir a segurança dos papéis americanos, num movimento que sobrevaloriza o dólar. Tudo isso existe. Mas o que potencializa a crise no Brasil é a presença no Planalto de um personagem radioativo, com a autoridade estilhaçada e os aliados em fuga. Um presidente assim fabrica crises, não soluções.
Encurtaram-se os horizontes de Temer. O próximo presidente será empossado apenas em 1º de janeiro de 2019. Contudo, terá de governar assim que sair o resultado do segundo tuno das urnas, em 28 de outubro. A nova administração será compelida a antecipar o esforço para a restauração dos signos do Poder. O sucessor de Temer terá de agir já na fase de transição. A crise pode exigir, por exemplo, a antecipação do nome do futuro ministro da Fazenda.
Quanto a Temer, terá de se habituar a uma rotina constrangedora. Um presidente cuja impopularidade roça a margem de erro das pesquisas arrisca-se a ser barrado pelo porteiro do Planalto, que passará a exigir um crachá. De volta ao Jaburu, Temer será mordido pelo cachorro da família. Seus seguranças cairão na gargalhada. Ao acordar, o presidente pedirá um café. E iniciará a leitura dos jornais pela sessão de empregos. O advogado tefonará para avisar que o Supremo quebrou o sigilo do boletim escolar de Michelzinho. No final da manhã, o garçom trará o cafezinho do presidente. Gelado.
De resto, o interesse de Temer pela qualidade do sistema prisional do país tende a aumentar na proporção direta da aproximação do final do seu mandato.
JOSIAS DE SOUZA
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