O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello decidiu nesta terça-feira 14 liberar a nomeação de Moreira Franco como ministro da Secretaria Geral da Presidência, recriada por Michel Temer no início do mês para abrigar um de seus principais aliados, alvo da Operação Lava Jato.
Em sua decisão, Mello considerou que não houve desvio de finalidade na indicação por parte de Temer, ou seja, que ele não indicou Moreira Franco para conceder a este status de ministro. "A nomeação de alguém para o cargo de Ministro de Estado, desde que preenchidos os requisitos previstos no art. 87 da Constituição da República, não configura, por si só, hipótese de desvio de finalidade", afirma o ministro em sua decisão.
Mello não considerou a decisão de Gilmar Mendes que impediu a posse do ex-presidente Lula como argumento para barrar a nomeação de Moreira Franco. Aproveitou ainda para elogiar o voto anterior de seu colega, "decisão essa cujo conteúdo mostra-se impregnado do brilho e da profundidade de análise que são peculiares aos pronunciamentos de Sua Excelência nesta Suprema Corte."
A decisão de Celso de Mello deve encerrar a guerra de liminares judiciais contra Moreira Franco. Na manhã da quinta-feira 9, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, sediado em Brasília, derrubou decisão proferida pela primeira instância, que barrou o peemedebista.
No mesmo dia, duas liminares, uma assinada por um juiz do Amapá e outra por uma magistrada do Rio de Janeiro, voltaram a cancelar a posse. Ambas as decisões foram revertidas na segunda instância, mas o TRF da 2ª Região, entendeu que o ministro não deveria ter direito à prerrogativa de foro.
Com o novo status de ministro de Estado, Moreira Franco, o “Angorá” das planilhas da Odebrecht, só pode ser investigado com autorização do Supremo Tribunal Federal. Está livre, portanto, da jurisdição do juiz federal Sergio Moro, responsável pela Lava Jato na primeira instância. A Secretaria Geral da Presidência da República havia sido extinta em 2015 pela então presidente Dilma Rousseff.
Antes da mudança anunciada por Temer, Moreira Franco era secretário-executivo do Programa de Parcerias em Investimentos (PPI), que continuará sob os cuidados de sua nova pasta, também responsável pelas secretarias de comunicação e administração, além do cerimonial da Presidência.
A medida foi anunciada por Temer na mesma semana em que o STF homologou 77 colaborações premiadas de executivos da Odebrecht. Na pré-delação de Cláudio Melo Filho, ex-diretor de Relações Institucionais da empreiteira, o promovido ministro Moreira Franco foi citado mais de 30 vezes, acusado de ter recebido dinheiro para defender os interesses da empreiteira no setor aeroportuário.
O documento, revelado pela mídia em dezembro de 2016, detalha o papel desempenhado pelo peemedebista. Confira a íntegra das declarações feitas por Melo Filho:
“Michel Temer atua de forma muito mais indireta, não sendo seu papel, em regra, pedir contribuições financeiras para o partido, embora isso tenha ocorrido de maneira relevante no ano de 2014, conforme detalharei adiante. Esse papel de “arrecadador” cabe primordialmente a Eliseu Padilha e, em menor escala, a Moreira Franco”, diz o texto.
Melo Filho afirma que seu relacionamento com Moreira Franco é antigo, fruto de “parentesco distante”. Um dos temas tratados com “Angorá”, segundo o delator, foi uma “demanda da Odebrecht para que fosse mantido o modelo de concessões de aeroportos, que inibia o monopólio”. Na sequência, descreve uma série de encontros com ele para tratar de favorecimento à empreiteira em contratos no setor aeroportuário.
Prossegue o delator: “Acredito que há uma interação orquestrada entre ele e Eliseu Padilha para captação de recursos para o seu grupo do PMDB, pois Moreira Franco me solicitou um apoio de contribuição financeira (relatada no Anexo Legislativo n. 4.1), mas transferiu a responsabilidade pelo recebimento do apoio financeiro para Eliseu Padilha”.
À época, Moreira Franco negou qualquer irregularidade: “jamais falei de política ou de recursos para o PMDB com o senhor Claudio Melo Filho”.
"Moreira Franco não é Lula"
Em meio à guerra de liminares contra a nomeação do peemedebista, a Advocacia Geral da União evocou um curioso argumento. Para a defesa do governo Temer, a situação de Moreira Franco é radicalmente distinta da vivenciada por Lula em março de 2016, quando foi impedido de assumir a Casa Civil do governo Dilma, após uma decisão monocrática proferida pelo ministro Gilmar Mendes, do STF.
As gravações que complicaram o ex-presidente foram consideradas nulas pelo relator da Lava Jato, o falecido ministro Teori Zavascki, pois foram interceptadas fora do período autorizado judicialmente. Mas, segundo a AGU, elas “ainda eram legais” quando Mendes analisou o caso do ex-presidente.
"Quando o ministro Gilmar Mendes, no mandado de segurança 34.070, admitiu as 'gravações' como fundamento para a concessão da ordem, o fez forte no fato de que as citadas gravações eram provas válidas, porquanto autorizadas judicialmente. Não eram provas ilegais. Só posteriormente o saudoso ministro Teori Zavascki as declarou ilegais", sustentou a AGU, ao pedir a anulação de uma das liminares contra Moreira Franco.
A argumentação não resiste aos fatos. No mesmo dia da divulgação das conversas, nas quais Dilma combinou a entrega de um termo de posse a Lula, o jornal Folha de S.Paulo e o portal UOL divulgaram que o juiz Sergio Moro havia mandado suspender as interceptações telefônicas antes do horário em que a Polícia Federal gravou o diálogo. Era de conhecimento público as circunstâncias em que a conversa foi grampeada.
Temer encaminhou ao STF um documento com explicações sobre a nomeação de Moreira Franco. O texto enfatiza que “não houve qualquer má intenção do Presidente da República em criar obstruções ou embaraços à Operação Lava Jato” e insiste na comparação com o caso de Lula: “as provas usadas contra o ex-presidente, à época, tinham a presunção de validade, visto que autorizadas por ordem judicial".
Segundo o advogado Pedro Serrano, professor de Direito Constitucional da PUC de São Paulo, a gravação "era e sempre foi uma prova nula". "A intercepção extrapolou o período autorizado pelo juiz Sergio Moro (da 13ª Vara Federal de Curitiba) e, portanto, a gravação era absolutamente nula de pleno direito. Não é preciso haver reconhecimento de algum juízo para considera-la nula. O ministro Teori Zavascki reconheceu isso mais tarde, mas o próprio Gilmar Mendes poderia ter feito a mesma coisa."
Serrano argumenta, porém, que não há nada que impeça o presidente da República de nomear réus ou investigados. "Impedir a nomeação de ministros de Estado, que não estejam impedidos por decisão judicial terminativa de ocupar cargos públicos, é uma flexibilização inaceitável da presunção de inocência. E também uma intromissão indevida do Judiciário na competência do Poder Executivo, sem nenhuma base jurídica plausível."
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