Arquivos mantidos em sigilo durante décadas mostram que integrantes da Polícia e das Forças Armadas não só davam cobertura mas também usavam e comandavam esquemas de exploração sexual e tráfico de pessoas, inclusive de adolescentes, no Distrito Federal.
No fim de 2016, o Governo do Distrito Federal, ao caracterizar documentos do arquivo da Secretaria de Segurança Pública do DF como “necessários à recuperação de fatos históricos de maior relevância”, publicou um edital abrindo um prazo de 60 dias para manifestações e/ou objeções. Como não surgiram questionamentos no período, o acervo está agora digitalizado e disponível à consultas.
No entanto, existem pelo menos cinco processos tratados ainda como secretos pela SSP/DF dentre os documentos e dossiês que abarcam um período entre 1963 e 1990. São diversos os documentos que apontam policiais e militares como mais do que frequentadores de bordéis, fazendo parte da “administração” e comando desses locais de exploração sexual e também aliciamento de menores.
Um dos relatos, publicados no Correio Braziliense, que teve acesso ao acervo, traz detalhes sobre o esquema que levava jovens de Minas Gerais à Brasília:
“Também não é possível saber se a PMDF tomou alguma providência em relação a um caso de tráfico interestadual de seres humanos, flagrado pela PM de Minas Gerais em abril de 1981. O Serviço de Inteligência da corporação mineira prendeu uma mulher na Rodoviária de Belo Horizonte sob a acusação de agenciar meninas com menos de 18 anos. Em depoimento, a suspeita, de 21 anos, confessou levar adolescentes para a capital para serem “usadas em hotéis de encontros amorosos”, segundo o relatório da PMMG.
A mulher contou ainda encaminhar as meninas agenciadas em Minas a cafetinas do DF. Em troca, ela recebia “Cr$ 2.000 (dois mil cruzeiros) por cada jovem virgem e R$ 1.500 (um mil e quinhentos cruzeiros) por não virgem”. Tal esquema, ainda de acordo com a acusada, moradora de Taguatinga, envolvia policiais militares do DF, que garantiam o funcionamento e a segurança dos “hotéis de encontros amorosos”, mediante dinheiro ou programas com as adolescentes. Mas o dossiê de tal caso também foi enviado incompleto ao ArPDF, não mostrando se a PMDF levou a investigação adiante.”
A cobertura que a polícia dá à própria polícia
Como vemos, o fato de mesmo esses dossiês antigos não virem à público em sua versão completa, mostra como a polícia e os órgãos de investigação não vão e não querem ir até o final em esclarecer esses envolvimentos escusos de seus próprios integrantes.
Em tempos onde as mulheres tem mostrado o caminho para lutar contra as mazelas desse sistema que se apropria do machismo para aprofundar a exploração, não podemos confiar que seja a polícia, a de ontem e a de hoje, a responsável pela proteção da vida das mulheres. Os arquivos ajudam a esclarecer de que lado eles estão, uma vez que a polícia de hoje é mais uma das heranças da ditadura.
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